O saudoso Darcy Ribeiro cunha uma expressão para definir o Brasil – renovo mutante – conforme se pode conferir no registro a seguir, mas, mais importante são as observações
inspiradas pelo saudoso educador e antropólogo. Vejamos:
“A sociedade e a cultura brasileiras são conformadas como variantes da versão lusitana da tradição civilizatória europeia ocidental, diferenciadas por coloridos herdados dos índios americanos e dos negros africanos. O Brasil emerge, assim, como um renovo mutante, marcado de características próprias, mas atado genesicamente à matriz portuguesa, cujas potencialidades insuspeitadas de ser e de crescer só aqui se realizariam plenamente.”
Interessante o que nos parece uma conclusão de Ribeiro, o fato do Brasil ter se tornado o projeto de Portugal enquanto nação pluralista, eis que, na América do Sul, o Brasil pode ser
um novo Portugal de dimensões continentais. O Brasil, em comparação a outras nações análogas, se constitui, de maneira geral, num bloco étnico homogêneo. Um fenômeno raro, a princípio, que merece maiores estudos. Reza a lenda que Darcy Ribeiro fugiu de uma
hospitalização para retomar e concluir sua obra-prima, a obra cita.
Há uma misteriosa sincronia entre a chegada das caravelas portuguesas em Porto Seguro e a chegada dos aviões da Força Área brasileira ao socorro dos yanomami – uma nação em construção. Mais do que uma construção, ou reconstrução, em sentido material, uma reconstrução no sentido profundo da palavra.
Os indígenas, Povos Originários, mais que donos da terra, eram, e são, a alma da terra; os brancos sempre foram criteriosos com suas crenças na religião dos mortos, carregando, primeiro, um punhado de terra dos antepassados, para depois, levar um rastro de dor e morte por onde transitassem.
Nada melhor do que a alma indígena, que foi escravizada por um século, para nos revelar a força de resiliência dessa enigmática nação que flerta com os ventos da violência e se
levanta numa mistura de sonho e paixão pela alegria da vida e da felicidade.
Povo escravizado, lutador, sonhador e trabalhador, em nome de Oxalá que esse país se erga sem verter as lagrimas e o sangue de outros povos.
É uma reconstrução, na ousadia dos indígenas, na força dos negros, na tenacidade de todos nos, filhos dessa terra, que queremos vê-la livres dos seus algozes, seja os verdugos do povo
yanomami, seja os abutres que se apoderaram da chave do cofre e chamaram de independência.
A reconstrução é um compromisso centenário da nossa geração e, até por isso, podemos amar esse Renovo Mutante.
1 Ribeiro, Darcy , “O povo brasileiro” – a formação e o sentido do Brasil. Companhia Das Letras, 2ª edição.